Superfaturamento em obras públicas: apuração
Superfaturamento em obras públicas: apuração

Diz o informativo que "para apuração de superfaturamento de contratos de obras públicas, admites-se a utilização de valores obtidos em notas fiscais dos fornecedores das contratadas como parâmetro de mercado (acrescidos do BDI), quando não existirem preços registrados nos sistemas  referenciais.

 

Antes de tecer qualquer comentário, é importante lembrar ao leitor o conceito de superfaturamento, agora expressamente previsto na nova lei de licitações e contratos:

 

Art. 6º LVII - superfaturamento: dano provocado ao patrimônio da Administração, caracterizado, entre outras situações, por:

a) medição de quantidades superiores às efetivamente executadas ou fornecidas;

b) deficiência na execução de obras e de serviços de engenharia que resulte em diminuição da sua qualidade, vida útil ou segurança;

c) alterações no orçamento de obras e de serviços de engenharia que causem desequilíbrio econômico-financeiro do contrato em favor do contratado;

d) outras alterações de cláusulas financeiras que gerem recebimentos contratuais antecipados, distorção do cronograma físico-financeiro, prorrogação injustificada do prazo contratual com custos adicionais para a Administração ou reajuste irregular de preços;

 

Veja que o dano ao erário pode ocorrer de diversas formas. O acórdão em análise apurou o superfaturamento decorrente do sobrepreço da obra, quer dizer, o valor pago pelo Poder Público foi acima do que deveria ter sido.

 

De forma bem resumida, para apurar o superfaturamento (decorrente de sobrepreço) é preciso adotar o mesmo critério que fora aplicado no momento da pesquisa de preços. Assim, a forma como se estabelece o valor de referência deve ser a mesma para verificar se há sobrepreço e superfaturamento. Para tanto, em contratos de construção civil, em regra, são adotados os sistemas referenciais de preços.

 

Esses sistemas referenciais nada mais são do que tabelas de preços que levam em conta a variação de preços num mercado específico, tal qual o da construção civil. Neste mercado, existem, por exemplo, o SINAPI - Sistema Nacional de Preços e Índices para a Construção Civil e o ORSE – Orçamento de Obras de Sergipe.

 

Assim como ficou consignado na NLL (art. 23, §1º, I) , a Corte de Contas Federal também adota preferência pelos sistemas referenciais de preços: "Registre-se que a priorização de sistemas referenciais federais como paradigma parte da premissa de que os custos apontados são decorrentes de criteriosa pesquisa de mercado, o que lança à disputa preços conservadores, conforme ponderações recentemente reiteradas do Relatório do Acórdão 955/2019 - TCU - Plenário"

 

Contudo, na ausência desses sistemas, é preciso lançar mão de outra forma de apuração, sob pena de não ser possível constatar o superfaturamento. Assim, veja o que segue no texto do acórdão:

 

"Ainda, deve-se observar ponderação do Ministro Benjamim Zymler em seu voto do Acórdão 2619/2019 - TCU - Plenário, referente a superfaturamento das obras da Refinaria Revap, em São José dos Campos:

 

É imperioso observar que, em alguns casos, os atos de corrupção abrangem obras extremamente complexas, com serviços de elevada especificidade, o que causa demasiada dificuldade para se estabelecer o preço paradigma de mercado para os itens avaliados. Há impossibilidade de quantificação do dano pelos métodos tradicionais, pois, além de se tratar de obras industriais com a previsão de serviços específicos e o emprego de equipamentos especiais, os quais não contam com sistemas de referência de custos, o grande volume de dados a ser analisado demandaria elevado tempo de análise, com risco de ineficácia processual. É exatamente essa a situação do ajuste ora examinado."

 

Vale pontuar que a forma de apuração do superfaturamento no caso em tela não é novidade, como bem ficou assentado no Acórdão 1992/2015 - TCU - Plenário:

 

"29. Com relação aos precedentes contrários ao uso dos custos incorridos pelo contratado como base para a obtenção do preço de referência, não se nega que esse é o entendimento correto à luz do regime jurídico dos contratos administrativos e do próprio sistema econômico do país que prega a liberdade de iniciativa e a busca do lucro.

30. Porém, em situações extremas como a que ora se enfrenta, em que não existem preços nos sistemas referenciais e o insumo analisado foi adquirido em um mercado monopolístico, julgo que o valor obtido das notas fiscais, acrescido de custos indiretos e BDI acima do atualmente aceito pelo TCU, constitui um parâmetro seguro do valor de mercado do bem. Tomando por base a ideia de abuso de direito e os princípios da boa-fé contratual e do não enriquecimento sem causa, entendo que os preços praticados pela contratada excedem o limite do razoável, não podendo ser considerados compatíveis com os de mercado." (grifou-se) .

(...)

Os documentos fiscais que comprovam os custos efetivamente incorridos na obra são referenciais adequados na ausência de custos nos sistemas referencias, sobretudo em contratos fruto de fraude à licitação e pagamento de propinas, contexto que induz falta de eficiência empresarial, bem como a maximização da remuneração contratual de maneira ilícita e não prevista na legislação ou no contrato (I.3)