Por Bruno Maciel de Santana
Não é o menor preço que dá qualidade à licitação. O menor preço é um critério de julgamento, mas não é parâmetro de aferição para a boa ou má contratação. Na verdade, a busca desenfreada pelo preço tem sido a principal causa para a ocorrência de contratos ruins.
Parece que a administração esqueceu do velho brocardo popular: “o barato sai caro”.
O foco do processo de licitação deve ser o atendimento do interesse público. Por alguma razão, que agora desconheço, o foco foi desviado para a incessante busca pelo preço baixo. Mas quem disse que preço baixo é a garantia de que o interesse público será atendido?!
“Professor, o baixo preço da contratação não é melhor para os cofres públicos?”
Não, não é. O melhor para os cofres públicos é pagar por um preço que garanta qualidade aos bens adquiridos e aos serviços prestados, assegure o pagamento de todos os tributos e ainda gere lucros à empresa. O preço baixo dificilmente comportará todos estes requisitos.
Não adianta querer passar por cima da lógica que movimenta o mercado e exigir que as empresas baixem demais seus preços. É até contraditório o Poder Público impor inúmeras obrigações contábeis, sociais e trabalhistas às empresas e, ao mesmo tempo, esperar que elas ofertem propostas cada vez mais baixas nos processos de licitação. A tendência é contratar empresas amadoras que precificam mal seus produtos e disputam licitação sem responsabilidade.
Repare que o problema começa, muitas vezes, na pesquisa de preços equivocada. A fonte de pesquisa considerada mais fiel à realidade do mercado é a que decorre de outras contratações similares. É verdade, não há como negar. O órgão, então, procura por licitações ou contratos encerrados, junta três preços e escolhe o menor deles para ser seu valor estimado.
Este valor estimado é o máximo que a administração aceita pagar. Então, um preço, que foi o menor alcançado num processo de disputa, deve ser o máximo que as empresas devem propor em outra licitação. Se numa licitação aquele foi o menor, como na outra será o maior?! Como isso pode dar certo?!
A nova lei de licitações e contratos procura corrigir isso ao dispor que o uso desta fonte de pesquisa deve observar o índice de atualização. Em outras palavras, aquele preço deve ser ajustado em face da inflação. Além disso, o órgão não pode ficar restrito a apenas uma fonte de pesquisas. Ele deve buscar outras opções como a consulta a sites especializados, notas fiscais emitidas e até fornecedores do ramo correspondente.
Outrossim, o critério de definição do valor estimado não deve ser sempre o menor preço. Cada contratação deve ser pensada conforme seu contexto, quer dizer, de acordo com o seu objeto, o mercado envolvido, o local, as fontes de pesquisa consultadas etc. A depender destes fatores, a média ou a mediana podem ser opções melhores para estimar o preço.
Há muito mais a se falar a respeito de pesquisa de preços. Isso é só uma noção bem resumida para melhor compreensão da situação apresentada.
Durante a disputa, outro problema vem à tona: a avaliação da exequibilidade da proposta. Afora as obras e serviços de engenharia, os demais objetos não possuem parâmetro definido para esta análise. A lei não disse e os regulamentos, em regra, também não. Caberia, dessa forma, aos editais disporem sobre as normas de aceitação das propostas, com a inclusão das regras referentes à exequibilidade. Entretanto, muitos não o fazem, o que deixa pregoeiros e licitantes desprovidos dos vetores necessários para a apuração precisa do preço proposto.
Na dúvida, o pregoeiro não desclassifica, afinal, o preço está abaixo do estimado, ele não tem como definir se é exequível ou não e o órgão quer porque quer que ele arranque o menor preço possível das empresas.
Duas semanas depois de assinado o contrato, a empresa solicita reequilíbrio econômico-financeiro, sob o argumento de que o preço está defasado e que não tem condições de executar o contrato tal qual firmado.
Aí, vira uma bola de neve. É aberto processo administrativo para análise do reequilíbrio solicitado, enquanto a contratada suspende a execução contratual. O órgão nega o reequilíbrio porque não houve fato extraordinário algum neste período, embora o preço, de fato, esteja bem defasado.
Outro processo administrativo é aberto, agora, para apurar a responsabilidade da contratada, ao tempo em que o órgão corre para chamar o segundo colocado na licitação, o qual só poderá assumir o contrato pelo preço do primeiro.
O segundo colocado entra nessa se quiser. Mas, ele assume o preço e, advinha...em pouco tempo pede reequilíbrio também.
Durante todo este tempo, o contrato foi mal executado, a administração precisou abrir vários processos, mobilizou diversos servidores, gastou com recursos operacionais e humanos e, no final das contas, não resolveu nada. A licitação obteve um preço baixo, mas nem de longe atendeu ao interesse público. Foi ineficiente e a suposta economia transformou-se em retrabalho, tempo perdido e dinheiro mal aplicado.
O barato saiu caro. Tanto a administração quanto as contratadas agiram com amadorismo. O pior, é que esta narrativa é baseada em fatos reais de diversos casos e em diferentes órgãos.
PS: Este post não é uma defesa das empresas. Nada disso. Se você prestou atenção, este post é um alerta para que a Administração acorde e redirecione seu foco para realizar uma boa contratação pública. Para tanto, ela deve conhecer melhor o mercado, seu funcionamento e, sobretudo, a sistemática de formação dos preços.