Pagamento atrasado: há direito a juros e correção monetária?
Pagamento atrasado: há direito a juros e correção monetária?

Por Natally Vasconcelos 

 

Você sabia que a previsão de critérios de atualização monetária para as hipóteses de atraso no pagamento de fatura pela Administração Pública é cláusula obrigatória em todos os contratos administrativos?

 

Já te fizeram a seguinte pergunta: “O fornecedor está cobrando a fatura atrasada e incluiu juros e correção monetária. Posso pagar? É legal?”

 

A resposta é SIM, com ressalvas.

 

Vejamos o que dizem a Lei nº 8.666/93 e a nova lei de licitações e contratos, a Lei nº 14.133/2021.

 

Dispõe o art. 55, III da Lei nº 8.666/93, ipsis litteris:

 

Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

(...)

III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

 

Na mesma linha, dispõe o art. 92, V da Lei nº 14.133/2021:

 

Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam:

(...)

V - o preço e as condições de pagamento, os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços e os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

 

Algumas premissas surgem da leitura do texto legal:

 

As cláusulas mencionadas no art. 55, III da Lei nº 8.666/93 e no art. 92, V da Lei nº 14.133/2021 possuem natureza essencial, necessária, portanto, obrigatória em todo e qualquer contrato administrativo firmado pela Administração Pública e que tenha por fundamento a lei de licitações;

 

A atualização monetária deve guardar relação com o período compreendido entre a data do adimplemento da obrigação e o efetivo pagamento.

 

Segundo o prof. Ronny Charles, “acreditamos de bom alvitre que o contrato resguarde período mínimo de tolerância entre o adimplemento da obrigação e a efetiva quitação, sem incidência de juros de mora.” (2021, p. 541)

 

Para o prof. Marçal Justen Filho, “em princípio, a atualização monetária é incabível nos contratos administrativos. Mas poderá tornar-se exigível nas hipóteses em que for superado o prazo contratualmente estabelecido para a liquidação do pagamento devido ao credor.” (2021, p. 1231)

 

E então você me pergunta: qual o prazo de tolerância que deve se ter como base para, em caso de inadimplemento da Administração Pública, ser possível a incidência de correção do valor devido ao prestador?

 

Normalmente os contratos preveem que o pagamento se dará 30 (trinta) dias após a apresentação da fatura. Este prazo é a tolerância, ou seja, cumprida a obrigação e emitida a respectiva fatura, tem o Poder Público 30 (trinta) dias para proceder à verificação do efetivo cumprimento da obrigação com a consequente liquidação e posterior pagamento.

 

Registre-se que em sendo necessária medição no seu contrato (obra e serviço de engenharia), o pagamento estará condicionado não à entrega da fatura, mas à medição do serviço executado dentro dos critérios e períodos estabelecidos no instrumento contratual, sendo esta medição, pois, pressuposto para liquidação e consequente pagamento.

 

E qual seria a ressalva quando eu disse que é devido o pagamento de juros e correção monetária quando houver inadimplemento da Administração Pública?

 

A ressalva, no meu entender, é a de que, em que pese seja devida a correção do valor em caso de não pagamento após o prazo de tolerância estipulado no instrumento contratual, deverá o Poder Público negociar esse valor a mais a título de recomposição do valor devido, cabendo ao prestador avaliar se, dentro de sua margem de disponibilidade desse direito, exigirá receber o valor completo ou aceitará recebê-lo com desconto relativo à parcela do juros e/ou da correção monetária.

 

Perceba: ainda que estejamos diante de uma cláusula obrigatória, o direito ao recebimento da recomposição pertence ao espectro de disponibilidade do particular contratado, podendo o prestador exercer o seu direito a recebê-lo ou não. Em querendo, a Administração Pública estará obrigada a fazê-lo.

 

Outro detalhe importante: quando do empenho do valor do contrato, lá no início da relação firmada, não havia previsão de pagamento de juros e correção. Em sendo realizado o pagamento por conta do atraso da Administração, defendo que deverá ser investigada a causa do atraso por meio de processo administrativo para apuração de eventuais responsabilidades.