Por Bruno Maciel de Santana
O processo atrasa e o pessoal logo aponta o dedo para o setor de licitação. A obra fica parada e todos logo dizem que foi culpa da licitação. E toda vez que surge um problema de entrega ou mesmo alguma irregularidade na contratação a maioria das pessoas não hesita em condenar o processo de licitação ou o setor de licitações pela responsabilidade.
É muito fácil apontar o dedo. Prática muito comum. Infelizmente, não vemos, com a frequência que deveria, uma análise apurada para identificação dos erros e dos problemas daí correspondentes. Põe-se logo a culpa na licitação que "é melhor”.
Não poderia haver maior equívoco. Invariavelmente, os problemas são periféricos, quer dizer, não decorrem dos setores de licitações ou do processo de licitação em si, mas do seu entorno. Com efeito, órgãos desestruturados, com deficiência de servidores qualificados, sem gestão por competências, sem ferramentas de controle, sem planos de capacitação, de compras ou estratégico, em outras palavras, sem uma boa governança pública, não produzem bons processos de compras públicas. Se a máquina administrativa não funciona bem seus processos, consequentemente, não serão bons. Eles serão morosos ou mal instruídos ou ineficientes. É óbvio.
Os processos de compras públicas perpassam vários setores administrativos e dependem de inúmeros atores, desde sua construção inicial até o deslinde final. É comum os autos tramitarem pelo setor demandante (o que precisa do bem ou serviço), setor de compras, de finanças, de licitações, pelo ordenador de despesas, dentre outros. Assim, ele caminha por quase toda a estrutura da administração. Sua construção, portanto, é conjunta de modo que a responsabilidade deve ser repartida por todos os envolvidos. “Mas, professor, no meu órgão tudo fica concentrado na licitação”.
Então, amigo, o erro já está aí. Por mais que haja órgãos pequenos, com poucos servidores, é preciso distribuir as funções mais importantes entre setores e servidores. É necessário repartir tarefas para evitar erros, fraudes e sua eventual ocultação. Outrossim, a segregação de funções otimiza os trabalhos no âmbito da máquina administrativa, permite maior expertise e torna o processo mais eficiente. Antes de seguir adiante, pontuo que não sou um defensor fervoroso do princípio da segregação de funções. Explico. Entendo que ele deve ser observado na maior medida possível, conforme as necessidades e as possibilidades dos órgãos. Por outro lado, ele não pode ser anulado, aniquilado, sem qualquer observância. Nem tanto ao céu nem tanto ao mar.
A par desta problemática, infelizmente, muito comum, a nova lei de licitações e contratos encontrou o culpado: a alta cúpula da administração, responsabilizando-a pela governança das compras públicas (art. 11). O novel legislador compreendeu que a culpa não é da licitação, mas da falta de governança dos órgãos e entes administrativos. De tal maneira, a Lei nº 14.133/2021 foi além e definiu condutas, objetivos e instrumentos para fazer acontecer a boa governança.
Portanto, responsabilizar o processo ou o setor de licitação por tudo é um tremendo equívoco. É uma visão antiquada e míope. Abra os olhos e você verá que sem uma mudança estrutural e mais profunda do órgão seus processos continuarão morosos e ineficientes. E sem a implementação da governança das contratações, a nova lei de licitações será apenas parcialmente aplicada e não surtirá os efeitos desejados.