A contratação direta por licitação fracassada
A contratação direta por licitação fracassada

Por Bruno Maciel de Santana

 

A licitação fracassada é aquela que resulta frustrada, quer dizer, sem vencedor. Ela pode ocorrer porque as propostas foram desclassificadas ou porque os licitantes foram inabilitados. Ocorre que a Lei nº 8.666/93, no art. 24, VII, diz que poderá ser feita a contratação direta em caso de licitação fracassada, mas apenas quando as propostas apresentarem preços acima do estimado (propostas desclassificadas). Para isso, o dispositivo traz uma condicionante:

 

·Na licitação em que os preços estavam acima do estimado, aos licitantes deve ter sido dada a oportunidade de apresentar novas propostas (art. 48, §3º da Lei nº 8.666/93).

 

Então, só será possível proceder à contratação direta para esta hipótese de licitação fracassada se as empresas tiverem tido a chance de ajustar suas propostas. Caso contrário, não poderá. Agora, presta atenção. O art. 48, §3º da Lei nº 8.666/93 faculta à comissão de licitação a utilização deste expediente: dar nova oportunidade aos licitantes. A administração faz se quiser. Concedida esta oportunidade ou não, a licitação será tida por fracassada se a situação não for alterada. Contudo, para efeitos de contratação direta, obrigatoriamente, aquela oportunidade deve ter sido ofertada. Percebeu a diferença?

 

O TCU tratou disso no acórdão nº 756/2022 – Plenário: É irregular a contratação direta com fundamento em licitação fracassada sem que antes tenha sido concedido o prazo de oito dias úteis às empresas participantes do certame para apresentação de outras propostas escoimadas das falhas que ensejaram a desclassificação (art. 24, inciso VII, c/c art. 48, § 3º, da Lei 8.666/1993). Reafirmo. A Lei nº 8.666/93 só admite a contratação direta em razão de licitação anterior fracassada motivada pelos preços altos. Os demais motivos que justificam um fracasso, como propostas inválidas (ex: objetos com especificações diferentes) ou inabilitação dos licitantes não foram contemplados.

 

Sinceramente, não vejo razão para o legislador ter feito esta diferenciação. De tal modo, entendo que as outras formas de fracasso também devem permitir a contratação direta. Como? Por meio da interpretação finalística (ou teleológica) da norma, segundo a qual o aplicador da lei deve buscar a finalidade para a qual ela foi criada. Para mim, não há dúvidas que a contratação direta foi permitida em caso de fracasso para evitar novo prejuízo ao poder público. Assim, existente a mesma razão, o prejuízo, todas as hipóteses de fracasso devem ser contempladas. Veja que é o mesmo motivo pelo qual é permitido proceder à contratação direta em caso de licitação anterior deserta.

 

De tal maneira, entendo, não seria desarrazoado realizar a contratação direta em qualquer caso de licitação fracassada, desde que se demonstre que a repetição do certame venha a provocar prejuízo à administração, e que os demais requisitos também sejam validados. Infelizmente, a Nova Lei de Licitações e Contratos não corrigiu isso. Ela também restringiu as hipóteses de fracasso que geram uma contratação direta, com um adendo: preços altos e propostas inválidas (art. 75, III, “a” e “b”). Em resumo, ela só a admitiu para os casos de propostas desclassificadas. Mas, e a hipótese de inabilitação de todos os participantes?! Ela também não gera fracasso e prejuízo à máquina administrativa?

 

Para resolver esta lacuna proponho o mesmo remédio explicado acima: interpretação finalística da norma. Desse modo, onde se lê “não foram apresentadas propostas válidas” (art. 75, III, “a”) leia, também, “não foram apresentados documentos de habilitação válidos”. Ora, tanto um quanto o outro provocam o mesmo resultado: licitação fracassada e prejuízos administrativos. É importante registrar que todos os requisitos para a contratação direta devem estar presentes: a) demonstração de que haverá prejuízo se houver a repetição do certame; b) manutenção de todas as condições definidas em edital de licitação realizada há menos de 1 ano.

 

"Mas, professor, as hipóteses de contratação direta por dispensa não são taxativas? O que o senhor propõe é uma nova hipótese não prevista em lei! Hum...isso dá muitas linhas de discussão. Numa próxima oportunidade e gente debate a respeito.