PNCP só é obrigatório quando completo
PNCP só é obrigatório quando completo

Dentre as formalidades previstas na NLLC, está o art. 75, §4º, que pontua a necessidade de o extrato do pagamento da contratação direta ser divulgado e mantido à disposição do público no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP). Outrossim, o art. 94 determina que deve ser feita a publicação no PNCP no prazo de até 10 (dez) dias úteis após a assinatura do contrato de contratação direta.

 

Ainda sobre o PNCP, o caput do art. 174 diz, expressamente, que ele é um “sítio eletrônico oficial destinado à divulgação centralizada e obrigatória dos atos exigidos por esta lei”. No mesmo sentido, o art. 54 destaca que “a publicidade do edital de licitação será realizada mediante divulgação e manutenção do inteiro teor do ato convocatório e de seus anexos no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP)”.

 

Percebe-se que o PNCP busca ser um grande projeto tecnológico com o fim de centralizar as informações, os instrumentos e o fluxo de dados acerca das compras públicas do país. Ocorre que esta monumental ferramenta administrativa, lançada em 09/08/2021, ainda não possui todas as suas funcionalidades em utilização, o que inviabiliza seu efetivo uso em todos as hipóteses exigidas em lei.

 

Em razão desta incompletude, alguns órgãos não poderão realizar contratações diretas?

 

Não. Este é o teor da decisão do TCU no acórdão nº 2458/2021 – Plenário:

 

(...) é possível a utilização do art. 75 da Lei 14.133/2021 por órgãos não vinculados ao Sistema de Serviços Gerais (Sisg), do grupo chamado órgãos “não-Sisg”, em caráter transitório e excepcional, até que sejam concluídas as medidas necessárias ao efetivo acesso às funcionalidades do Portal Nacional de Contratações Públicas - PNCP;   

 

Eu já defendia esta tese, conforme abordei em meu livro, no qual levantei os seguintes fundamentos abaixo.

 

O primeiro argumento está no art. 194 que determina a entrada em vigor da lei no dia de sua publicação, isto é, 1º de abril de 2021. Ora, se a lei já está vigente, ela pode ser aplicada. Seria contraditório ela determinar o início de sua vigência e, ao mesmo tempo, impedir sua utilização.

 

O segundo argumento decorre do art. 191 c/c art. 193 que apontam para um período de dois anos de transição entre os regimes legais, de modo a manter uma convivência harmônica entre a lei nova e as “velhas”. Se a aplicação da nova lei for obstada, não haverá uma efetiva transição, nem um processo de aprendizagem prático, em contraposição ao que o legislador deseja com a criação deste prazo de coexistência normativa.

 

Terceiro argumento: há outras formas de suprir a publicação dos atos exigidos em lei. A publicação tem a finalidade de informar, ofertar transparência, atribuir eficácia e chamar as pessoas a participar dos certames, o que já acontece a contento pelos meios utilizados hoje. O PNCP, ao concentrar as publicações num lugar só, ampliará o acesso à informação, numa excelente iniciativa de interesse público. Esse é o seu objetivo. Ótimo. Mas impedir que a lei nova seja aplicada não vai contribuir em nada com esse propósito.

 

O quarto argumento parte do senso das proporções. Uma lei nova a qual se propõe a mudar um sistema em âmbito nacional, que estabelece um prazo de dois anos para sua assimilação e prática, não pode ser impedida pela falta de implementação de uma ferramenta administrativa. Não é razoável atribuir tamanho poder a um banco de dados, por mais incrível que ele venha a ser. Há desproporção entre causa e consequência.

 

O quinto e último argumento sustenta que, se for levada adiante a tese de não utilização da nova lei enquanto o portal não funcionar integralmente, pode acontecer de não haver lei alguma a ser aplicada a partir de 1º/4/2023. Veja. Nesta data, as leis velhas serão revogadas. Se o portal não estiver pronto, conforme esta corrente, a lei nova, também, não poderá ser aplicada. Desse modo, estaremos no limbo normativo, situação completamente descabida.

 

Em outras palavras, esperar que o portal esteja completamente pronto para o uso da Lei nº 14.133/2021 traz muitos prejuízos e nenhum benefício. Nenhum. É simples cumprimento de norma, deslocada da realidade e do sistema no qual ela está inserida. Também adota este posicionamento os professores Jacoby Fernandes (https://www.youtube.com/watch?v=ME8J7YU6laM&t=126s), Ronny Charles (https://open.spotify.com/episode/3P5TWv9HkuhIdK0iDP9JJT), a Procuradoria Geral do Distrito Federal (Parecer Jurídico n.º 235/2021 - PGDF/PGCONS), e, agora, o Tribunal de Contas da União.